23.7.13

Porque lemos tão pouco?

Estudamos para um exame para o podermos passar, ter boas notas, e prosseguir com sucesso os nossos estudos e a nossa futura vida de trabalhador.
Guiamos um carro para chegar do ponto A ao ponto B.
E no caso da leitura? Porque lê-mos. De que serve ler?
Porque lê-mos tão pouco?

A resposta é simples.
Porque não é fácil identificar um objectivo na leitura.
E, de facto, a meu ver, a literatura não tem um objectivo imediato.

Quem quer ser escritor (ou mesmo um bom leitor) não tem outro caminho senão o da leitura.
Ler torna-nos, sem dúvida, leitores mais atentos e escritores mais hábeis.
Mas se o motivo para ler aqui é óbvio, e para quem não tem interesse em ser nem escritor nem sequer um bom leitor?

Há quem já se tenha debruçado sobre isto.
Os motivos que definem a razão pela qual deveríamos ler são vários.
Há quem diga que nos torna mais inteligentes, que é crucial no nosso processo educacional.
Há quem diga que nos faz mesmo melhores pessoas, mais compreensíveis, mais elucidadas em relação à mecânica do mundo.

Embora ambos os motivos pareçam plausíveis, não o são.
Isto porque não têm em consideração um factor essencial: que livro estamos a ler.

Ler "Crime e Castigo" não terá o mesmo efeito educativo nem moral do que ler "O Cão Pantufas".

Assim sendo, podemos concluir que sim, alguns livros nos tornam mais inteligentes, podendo mesmo fazer com que questionemos as nossas mais antigas e ressequidas morais.
Mas se isto não acontece com todos os livros, o que tem a leitura (de qualquer livro) de positivo?

A meu ver, o poder da leitura, comparado ao de ver um filme, ou ao de analisar uma obra de arte numa galeria, prende-se exactamente com o oposto do que estas últimas tem para oferecer: o que está lá.

Um livro, num sentido plano, são "apenas" palavras amontoadas numa determinada ordem.
Cabe ao leitor criar o seu mundo, a sua interpretação.
Deste modo podemos dizer que cada livro é concebido não apenas pelo escritor, mas também pelo leitor.
Um livro é provavelmente a obra de arte mais subjectiva de todas as formas de arte.

Um bom livro prima mais pelo que não está lá, do que pelo que lá está.
Uma boa descrição de uma face não é conseguida utilizando vinte adjectivos, mas sim um ou dois certeiros.
Com apenas dois adjectivos não podemos dizer tudo o que a face tem, mas podemos dar a ideia do que não lá está.
O resto cabe ao leitor. O trabalho do escritor não é o de descrever tudo minuciosamente. É o de descrever o suficiente de modo a cativar o leitor de tal modo a que este se sinta compelido a imaginar o resto.

O meu ódio (quase absoluto) por livros com imagens parte exactamente dai — arruinam a beleza do livro, arruinam a imaginação necessária para o ler, aproximando-o de um filme ou de um quadro, no sentido que o tornam imagético.


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Mas, em relação, podemos definir um problema ainda maior: porque tem a literatura de ser defendida deste modo?
Isto é uma mera repercussão dos dias de hoje, onde tudo o que fazemos deve ter um objectivo definido e, preferivelmente, imediato.

A literatura prima por não ter.
Ela quebra a rotina do dia-a-dia e faz-nos parar e pensar.
É esta a beleza da literatura.

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